As palavras de 10 dólares

Chronicle Review, como podem ver fonte recorrente deste blogue, faz um longo perfil do ministro Mangabeira Unger. Aqui. CR tem um diretório de compilação de artigos, ensaios e resenhas chamado Arts & Letters Daily. É um serviço bem completo, com ligações para os principais jornais, blogueiros e articulistas da lingua inglesa. A&L era um sítio independente, quase fechou as portas depois do 11 de setembro, se não me falha a memória, até ser incorporado pela CR. Esse movimento representou igualmente uma guinada conservadora, tanto no teor artigos quanto na seleção. Sinal dos tempos, uma distenção pós-Bush se avizinha e o A&L deve encontrar um bias mais adequado à proposta orginal. Ainda assim é uma boa fonte de consulta sobre o que se escreve por aí. Como eles se definem, idéias, críticas e debates.

O diretório nunca deu uma palavra sobre o Brasil. Ou melhor, não havia dado até o artigo sobre Unger. Da América Latina, comentários eventuais sobre os escritores consagrados da lingua espanhola, os de sempre, e Chavéz, vez por outra, mas invariavelmente escurraçado na mídia internacional. Ao gigante a despertar e seu carismático presidente, necas. O artigo sobre o ministro “extraordinário” veio na esteira da saída de Marina Silva, uma hecatombe midiática internacional sobre a Amazônia.

Mangabeira Unger é tratado com uma incrível deferência. Em poucas linhas, é comparado a John Stuat Mill e, textualmente, uma citação o lembra como “um dos mais brilhantes escritores (da filosofia do direito) desde Hegel”. Sobre sua opção pela prática da política, o autor do perfil, Carlim Romano, professor de filosofia na Universidade da Pensilvânia, vai até Platão conselheiro de Dionísio de Siracusa e David Hume, alçado ao posto de subscretário de estado. Não sem alguma graça, imaginamos Unger no papel de Platão e Lula, na toga de Dionísio de Siracusa.

Evidentemente, o ministro goza de prestígio no meio acadêmico. As poucas aberturas polêmicas do texto referem-se às sofisticadas análises sobre seus livros e teses de Filosofia do Direito. Romano, passou uma semana com Unger e faz uma bem humorada menção ao suposto constrangimento da inevitabilidade de sua ascensão ao cargo, dada a sua história familiar, sobretudo no relacionamento com seu avô, Otávio Mangabeira. Uma incongruência com algumas de suas teorias mais caras.

Roberto Mangabeira Unger tem uma visão interessante sobre a dinâmica da imaginação transformadora na sociedade. De certa maneira, é um confronto direto com teses tacanhas de “fim da história” e a pretensa estabilidade de longo prazo, e irreversível, das democracias liberais. Suas escolhas políticas no entanto são um tanto aborrecidas. Unger tem fixação em líderes carismáticos, como força motriz dessa transformação. Um equívoco de origem. Deixou-se embalar com o Brizola, quando esse não tinha mais lenha para queimar e depois com Ciro Gomes, a quem as “flexibilizações institucionais” propostas por Unger são pouco recomendáveis.

Pragmatismo, senso de urgência e vaidade o levaram a retroceder nas críticas a Lula. Ainda assim, o caldo harvardiano-tupiniquim de experimentalismo e voluntarismo podem jogar um pouco sabor no marasmo das idéias vigentes. O ministro do longo prazo não terá muito tempo, mas pode fazer um barulho danado.

Em tempo: o articulista se diz intrigado com o fato de Mangabeira trocar um salário de 250 mil dólares por ano pelos ganho de US$4 mil por mês no governo. Não tem idéia do que um cargo como esse pode representar.

(junho de 2008)

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